Dr. Mukwege breaks the silence in Porto Alegre by FRONTEIRAS DO PENSAMENTO

Dr. Mukwege breaks the silence in Porto Alegre by FRONTEIRAS DO PENSAMENTO
Denis Mukwege and Marcos Rolim (clik on the picture above - part 1)

UMA VOZ CONTRA A INDIFERENÇA

Carolina Marquis e
Mônica Reolom, especial JORNALDO COMÉRCIO

6 de julho de 2010

UMA VOZ CONTRA A INDIFERENÇA

O ginecologista Denis Mukwege,
da República Democrática do
Congo (atualmente em guerra civil)
esteve recentemente em Porto
Alegre. O médico palestrou no
Fronteiras do Pensamento sobre
sua experiência no atendimento
a mulheres vítimas de violência
sexual em seu país. Maior especialista
do mundo na reparação
interna de genitais femininos,
seu trabalho recebeu, em 2008,
o Prêmio Olof Palme, concedido
a pessoas que se destacam na
ajuda humanitária e missões de
paz. Além disso, concorreu com
Barack Obama ao Prêmio Nobel
da Paz no ano passado.

Panorama - JC - Qual é
hoje a situação da mulher
na República Democrática
do Congo?
Denis Mukwege - Em geral,
ser mulher não é fácil. Há dé-
cadas elas travam um combate
que hoje pode estar se tornando
mais fácil em alguns países.
Ser mulher na África pode ser
muito difícil. Na África negra,p
mais difícil ainda. E ser mulher
na República Democrática do
Congo é quase o inferno. O que
as mulheres vivem lá, hoje, é
quase inédito na história da
humanidade.
Panorama - O que fez despertar
em você a vontade de
lutar pelas mulheres, de fazer
dessa a sua bandeira?
Mukwege - Às vezes eu me
faço a pergunta inversa: como
alguém pode assistir a tudo isso
e ser indiferente. Se alguém
consegue ser indiferente ao
que acontece lá, significa que
perdeu algo muito importante:
a humanidade. Eu tenho um
contato muito importante com
as mulheres. Elas confiam em
mim, elas vêm me procurar e me
relatam tudo aquilo que destruiu
a sua dignidade. Então eu me
encontro no cerne do problema.
Ser indiferente a essa situação
não seria nem aceitável nem
tolerável, isso seria impossível.
Seria, inclusive, um crime.
Panorama -Existe alguma
maneira de reconstruir a
humanidade e a dignidade
de uma mulher que sofreu
abuso?
Mukwege - As mulheres têm
uma capacidade além do comum,
além daquilo que se possa imaginar.
Quando tive contato com a
primeira mulher nessa situação,
fiquei desesperado, perguntando
como é que ela poderia recuperar
a dignidade no plano moral, mesmo
que fosse reconstruído todo
seu aparelho genital, mesmo que
fisicamente ficasse bem. Como
é que ela poderia reconstruir-se
em sua dignidade, em sua autoestima,
no seu ser. Uma coisa
que eu observei é que as mulheres
são diferentes dos homens.
Elas têm a capacidade extrema
de proteger e de amar. Elas portam
a vida, protegem-na, lutam
por ela. Além de disso, elas têm
a capacidade de encarar todas as
agressões que os homens fazem.
As mulheres são capazes, muito
mais do que os homens, de supera
ção. E são capazes de superar
o insuperável.
Panorama - Existe algum
tipo de acompanhamento
psicológico para as mulheres
que passam pelo procedimento
da cirurgia?
Mukwege - A cirurgia e o
atendimento médico são as partes
mais simples dessa história
toda. Isso pode ser enquadrado
em um tempo ao passo que o
acompanhamento psicológico
tem que ser feito a longo prazo.
Há uma equipe de assistentes
sociais que tenta acompanhá-
las. A ferida física se fecha,
cicatriza e pronto. O problema
é que a ferida narcísica, a ferida
pessoal, é um ferimento que pode
voltar a se abrir diante de uma
experiência, ou vivência, que se
assemelhe à violência que causou
o trauma. Essa é uma ferida
que não cicatriza nunca.
Panorama - E para as
crianças que nascem desses
abusos, existe também um
tratamento psicológico?
Mukwege - Existe um acompanhamento,
mas esse é um
grande problema porque essas
crianças têm, em geral, uma
relação muito difícil com a mãe.
Essas crianças sofrem as consequ
ências diretas desse estupro
na relação materna. Para a
comunidade, são crianças consideradas
sem filiação. Muitas
vezes, foi o pai dessa criança que
matou toda a comunidade. Portanto,
é muito difícil fazer que
ela escape das consequências
desse estupro. Ela vai ser muitas
vezes vítima desse estupro.
Panorama - Existem mulheres
que, depois de serem
operadas, sofram um novo
estupro e têm que voltar à
mesa de cirurgia?
Mukwege - Sim, isso pode
acontecer e é uma das situações
mais dramáticas que existe para
a equipe de médicos. Quando
uma mulher se operou, foi tratada,
cicatrizou, foi para sua aldeia
e volta novamente violentada,
vítima do estupro. Aí nós temos
o sentimento de que é um círculo
vicioso, e nos sentimos muito
impotentes. Não sabemos nem
o que dizer a ela.
Panorama - Que coisas
todos nós deveríamos fazer
para ajudar esse tipo de situa
ção? Que postura o mundo
deveria tomar frente a um
problema como esse?
Mukwege - O mundo deve
lutar contra a indiferença. Nunca
se deve ter a impressão de
que essas histórias estão muito
longe de nós. Nós vivemos no
mesmo planeta e, por mais que
tenhamos a sensação de que as
coisas acontecem muito distantes
de nós, elas acontecem muito
próximas. A minha presença
aqui é para ganhar a voz dos
brasileiros e marcar a presença
de vocês com essa voz na cena
internacional. A voz de vocês é
muito importante e é essa voz
que pode fazer toda a diferença.
Se vocês se calarem, essa indiferen
ça vencerá. Se vocês, como
jornalistas, puderem fazer ouvir
a voz de vocês às mulheres e
aos homens e brasileiros, será
importante. Nós precisamos de
vozes como a de vocês. Às vezes,
as pessoas acham pouco pedir
a alguém a sua voz, mas não é.
Doar medicamentos, não basta;
a voz das pessoas pode ser muito
mais eficaz. Se eu levei uma semana
para vir para cá, deixando
de operar, é porque acho que é
muito importante falar e pedir
ajuda à voz de vocês.
Panorama - Que tipo de
assistência, em um país onde
não há guerra civil, deveriam
receber as mulheres
violentadas?
Mukwege -A violência sexual
existe em todos os lugares do
mundo: em Porto Alegre, em
Nova Iorque, em Paris. Eu acho
que é preciso engajar o maior nú-
mero possível de homens nessa
questão. Nós não podemos exigir
que as vítimas consigam lutar
contra isso. São os homens que
deveriam ter um engajamento
maior. Muitos pensam que estuprar
equivale a ter uma relação
sexual, mas é uma destruição,
é um crime. É preciso fazer os
homens entenderam que o ato
faz dessa pessoa um criminoso.
Muitas vezes as mulheres que
foram violentadas têm de provar
que isso aconteceu, o que se
transforma em mais uma ferida
para elas. Entretanto, creio que
há uma diferença entre o que
se passa aqui e o que acontece
em países com guerra civil. No
Congo, a violação vem acompanhada
de mutilação e destruição
voluntária do aparelho genital
feminino.
Jornal do Comércio - Porto Alegre

FRONTEIRAS DO PENSAMENTO

Terça-feira, 6 de julho de 2010
Uma voz
contra a
indiferença
ANA PAULA APRATO/JC
O médico congolês Denis Mukwege é um dos maiores especialistas do mundo em cirurgia reparadora
População feminina do Congo trava luta há décadas contra a violência
JOE KLAMAR/AFP/JC
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